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DOM JAIME COLLINS

Da Irlanda para Pedro Afonso: a história de um homem de ação

26/02/2021 13h16 - Atualizado em 01/03/2021 10h05

Luciene de Sousa Ribeiro
Mestranda em História das Populações Amazônicas – UFT/PN.
E-mail: [email protected]

Início da década de 1990. Toco a campainha e uma senhora de meia idade aparece no portão da residência episcopal em Miracema do Tocantins. Hesitei um pouco, mas decidi entrar quando uma porta se abriu a minha frente. A hesitação se deu em virtude dos sobreavisos das amigas sobre a “fria” em que eu estava prestes a entrar. Enquanto aguardava para uma entrevista de trabalho, em minha mente de 17 anos se passaram muitas coisas, até mesmo do orgulho que sentiria meu pai, um homem com uma missão especial de cuidar dos padres por ocasião das “desobrigas”, em uma comunidade no sertão de Lizarda (TO).

Uma porta lateral da sala se abre e de repente aparece o temível “bispão”, com cerca de 120 quilos, distribuído em um metro e noventa de altura. À distância, já o vira algumas vezes, no Centro de Treinamento de Líderes (CTL) e nas missas da catedral. Veio sorridente.

Naquele mesmo dia, logo cedo, padre Rui me comunicou que o bispo estava precisando de uma secretária urgentemente e que havia indicado meu nome, portanto, eu deveria ir conversar com ele.

Nossa conversa foi muito tranquila, umas das coisas que me perguntou foi o que eu achava dele. – “Penso que o senhor não é muito compreendido”, foi o que consegui dizer no momento. E isso foi o suficiente, ele concordou. Daí resultou em cinco anos de contrato de trabalho e muita admiração por seus feitos.

Quem é esse homem?
Jaime Collins foi um missionário redentorista irlandês que veio para o então norte goiano (hoje Tocantins), na década de 1960, juntamente com os padres: João Myers, Miguel Kirwan e Tiago McGrath, visando atender uma reivindicação de dom Alano Du Noday, então bispo de Porto Nacional (TO) e dom Helder Câmara, secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Os primeiros anos viveram em Pedro Afonso, e depois padre Jaime Collins, superior dessa missão, foi para Fortaleza – CE, a fim de fundar a Vice-Província. Em 1966, retorna como bispo prelado de Miracema do Norte (atualmente, Miracema do Tocantins). Dom Jaime foi um missionário dedicado, extremamente solidário e preocupado com o povo. Além de propagar o Evangelho, cuidou do bem estar das pessoas, sobretudo os menos favorecidos da circunvizinhança.

Infância
James Collins nasceu em 26 de fevereiro de 1921, em Moyvane, no Condado Kerry, na Irlanda, filho caçula de Michael Collins e Catherine Collins, ficando órfão de mãe com pouco mais de um ano de idade. A família Collins teve ao todo oito filhos, dentre eles dois padres e uma freira, o que era bem comum nas famílias irlandesas.

Vida sacerdotal
Aos 12 anos entrou para o Seminário Menor dos Padres Redentoristas em Limerick. Aos 23 anos, em 03 de setembro de 1944, foi ordenado padre. De 1947 a 1959, trabalhou como missionário nas Ilhas Filipinas, na Ásia, desempenhando por três anos a função de Superior do Convento dos Padres Redentoristas em Tacloban.

Episcopado

Como bispo de Miracema ajudou sobremaneira no desenvolvimento da região, sobretudo na área da educação e da saúde. Para cumprir seus objetivos, por inúmeras vezes, ele recorreu aos demais estados brasileiros, ao seu país natal e a outros países em busca de recursos financeiros e humanos. No início da década de 1980, a prelazia foi transformada em diocese e dom Jaime permaneceu como bispo titular até 1996, quando solicitou a sua renúncia e a nomeação de dom João José Burke, que era bispo coadjutor, como bispo titular.

Morte e sepultamento
No presente texto, não posso deixar de mencionar os demais missionários redentoristas da Província da Irlanda, que foram enviados gradativamente ao Brasil, a pedido deste, para assumirem novos desafios e trabalharam incansavelmente nas cidades e nos sertões do antigo norte de Goiás. Alguns desses missionários já morreram, outros vivem no Brasil, nos estados do Ceará e Piauí, e outros na Irlanda, como o irmão Pascoal e um dos pioneiros dessa missão, padre João Myers, dentre tantos outros. Atendendo a recomendações médicas, dom Jaime e seu fiel confrade, irmão Pascoal, viajaram à Irlanda em 1999 e devido a problemas de saúde do bispo, não conseguiram mais voltar.

Sexta-feira, 04 de outubro de 2002, aos 81 anos, dom Jaime termina sua missão aqui na Terra. Seu corpo foi enterrado no mosteiro em Limerick, próximo a um belo jardim, à sombra de algumas árvores frondosas e que certamente as viu crescerem e vice-versa.

Sempre tive vontade de registrar a trajetória de dom Jaime, dada à invisibilidade existente acerca de suas memórias. E em 2019, tive o privilégio de ter um projeto de pesquisa, com esse objetivo, aceito no Programa de Pós-graduação stricto sensu em História das Populações Amazônicas, da UFT/Campus Porto Nacional, desde então venho trabalhando nesse intento.

Nesse ano do centenário de vida do bispo, sob a orientação do historiador, professor Dr. Marcos Alexandre Arraes, pretendo apresentar o resultado dessa pesquisa. Através da narrativa da história de vida do bispo é possível também conhecer várias histórias da região, que não está contida na história dita “oficial”.





Nota da Redação: Se estivesse vivo, dom Jaime Collins completaria 100 anos de idade hoje, 26 de fevereiro de 2021.
 

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