Em meio a chuva, uma folha alçou voo diretamente ao chão. Ninguém teria visto, a não ser por mim da janela embaçada do carro. Lembrei-me dos dias em que as folhas caem e ninguém vê. No meio das matas, árvores inteiras caem e ninguém vê. Nas cidades, árvores caem e continuamos sem vê-las ou ignoramos os troncos no chão.
Ignoramos, como ignoramos o problemas alheios, escondidos por sorrisos em meio às rodadas de amigos que mesmo sendo tantos em diversos momentos ainda não conseguimos deixar de nos sentirmos sozinhos e solitários.
Ignoramos mensagens, áudios, imagens que mostram que o outro não está bem, afinal, pode ser frescura. Todo mundo fica triste, é normal, mas precisamos das pessoas aparentemente felizes, mesmo que estejam um caco por dentro.
Ignoramos pedidos de ajuda por uma conversa franca, a necessidade de uma companhia só pra desabafar, um olhar de pesar por trás do sorriso largo.
Ignoramos e continuamos a ignorar o outro, a negligenciar problemas sentimentais, a sua dor. Não só ignoramos como minimizamos e normatizamos esses sentimentos como algo supérfluo e desnecessário, principalmente quando tratamos de homens, que devem ser sempre duros e fortes. Afinal, homem não chora, isso é demonstrar fraqueza.
Desta forma, ignorando os outros e os nossos próprios sentimentos, acabamos como as árvores que caem no meio da selva. Ninguém vê, nem mesmo nós, pois estamos ocultando aquilo que sentimos com distrações como bebidas, drogas, festas, trabalho, colegas que só dividem momentos de farras com a gente.
Esquecemos porém que, assim como os troncos caídos, que decompõe até não existir mais nenhum vestígio da sua existência, a gente vai se decompondo, apodrecendo, se solapando pouco a pouco. Mesmo assim, ninguém vê... Ninguém se importa.
Até que chega o momento que não estaremos lá, que só restará a lembranças de um lugar que antes ocupávamos. Aí sim, os outros percebem e param de ignorar, gritando a todos os cantos que não poderiam prever tais acontecimentos, mesmo com todos os sinais deixados no dia a dia.
Neste momento choram, pintam os celulares de luto, ao perceber que, assim como os troncos das árvores e as folhas que caem durante a chuva e se unem ao chão onde serão esquecidos, nossos corpos também são depositados na terra deixando o alerta que se não tivéssemos ignorado tanto, talvez outro não fosse hoje apenas uma lembrança.
Luto por Bruno Wericles Neres da Silva Wanderley